terça-feira, 6 de abril de 2010

A Rainha da Floresta

Era um lenhador. Passava o dia na floresta, a cortar árvores. Os filhos traziam-lhe o almoço que ele comia à pressa, para voltar, depois de uma breve sesta, ao seu trabalho. Era muito cansativa a vida dos lenhadores.
Uma tarde, ia ele desferir a primeira machada numa grande árvore, quando ouviu conversar dentro do tronco. Estranhou. Espreitou.
O tronco era oco e, lá dentro, dois velhos de longas barbas, um diante do outro, muito solenes jogavam às damas.
- Não nos interrompas - disseram os velhos.
O lenhador aguardou que tempos, entretido, ele também, a assistir ao desenrolar da partida, que nunca mais se decidia.
A certa altura reparou que as barbas dos dois velhos tinham crescido imenso, enquanto eles jogavam. O lenhador, a medo, chamou-lhes a atenção para este estranho facto. Os velhos riram-se:
- Passou-se mais tempo do que tu imaginas.
De facto, a árvore estava maior e a floresta mais cerrada. Que teria acontecido?
Sobressaltado, o lenhador voltou à aldeia, mas já não encontrou ninguém conhecido. A casa, a mulher e os filhos tinham desaparecido e ninguém se lembrava deles.
O lenhador correu outra vez para a floresta e pediu aos dois velhos jogadores de damas que o acordassem daquele sonho mau.
Aquilo não podia estar a acontecer-lhe.
Era, certamente, um pesadelo.
Os velhos concederam-lhe o que ele pedira, não sem antes o fazerem prometer que nunca abateria aquela grande árvore, no interior da qual eles jogavam um interminável jogo de damas.
Quando o lenhador acordou, estava tudo como dantes. Afinal, sempre tinha sido um sonho. Mas, à cautela, o lenhador poupou a árvore, rainha da floresta.




António Torrado in Histórias do Dia

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