sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A estrela de prata

Numa árvore que eu cá sei – que nós sabemos – estão uma estrela de prata e uma bola de cristal.

— O que fazemos aqui? — perguntou a estrela.

— Estamos a enfeitar — respondeu a bola.

— O que é enfeitar? — perguntou a estrela.

— É fazer vista, ornamentar, alindar... — respondeu a bola de cristal.

Passou-se um tempo e a estrela perguntou de novo:

— Porque estamos a enfeitar?

— Porque esta árvore não é como as outras. Os frutos dela são raros. Aparecem um dia, luzem o seu quê, conforme sabem ou podem, e depois são colhidos e guardados, até para o ano.

A bola de cristal tinha muita experiência de outros Natais, ao passo que a estrela era nova, de prata fresca, e não sabia quase nada. Mas tinha ouvido falar que havia estrelas cadentes, estrelas que caem do céu e no céu desaparecem, num sopro de luz.

— Não serei uma dessas? — perguntou à bola.

— Talvez sejas, talvez não sejas... Mas não experimentes.

Passou-se um tempo mais, e a estrela guardou para si aquela ideia, uma ideia pequenina. "Não experimentes", dissera-lhe a bola. E se experimentasse? Foi o que fez.

Caiu, num susto, mas como era leve, inocente e frágil, uma corrente de ar, vinda de uma porta aberta, algures, levou-a consigo.

Levou-a consigo e fê-la poisar, sem estrago, no fofo musgo.

— Olha, é a estrela da gruta — disse alguém que estava a armar o presépio.

E estrela do presépio ficou.

Donde estava, onde a puseram, via o presépio, os pastores, os reis magos, as lavadeiras com a trouxa à cabeça, as leiteiras com a bilha à cinta, os vagabundos, o moleiro, o azeiteiro e todo o povo do presépio e mais as pessoas de carne e osso, que vinham admirar aquela lindeza, sorrir para o Menino Jesus e olhar para a estrela, suspensa do alto da gruta.

Estrela de oito pontas que era, a apontar em todas as direcções, nem ela sabia para onde, brilhou imenso.

Brilhou o mais que pôde.

Para o ano, a estrela de prata já tem muito que contar à bola de cristal.

António Torrado, in história do dia

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