segunda-feira, 30 de maio de 2011

TROVAS A UMA CATIVA

Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que para meus olhos
Fosse mais formosa.

Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas,
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.

Uma graça viva,
Que neles lhe mora,
Para ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.

Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.

Presença serena
Que a tormenta amansa;
Nela enfim descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo,
E, pois nela vivo,
É força que viva.

Luís Vaz de Camões

quarta-feira, 25 de maio de 2011

sexta-feira, 20 de maio de 2011

A voz do mar

O Artur sentiu sobre a orelha uma coisa muito fria, com um som...
- O que é, mãe?
- Não ouves?
Sim, ouvia. Era um som pesado lá ao longe e que depois vinha, vinha e subia, e que depois se tornava mais brandinho, para logo voltar a vir de longe. Parecia música, mas não era bem música. E talvez fosse. Bom, não seria bem música.
- O que é, mãe? - voltou a perguntar. - Que barulho é este?
- É o mar... É a voz do mar...
- A voz do mar?!
- O mar fica longe, mas a voz meteu-se aí dentro. Isto é um búzio.
- E onde nascem os búzios?
- No mar.
-Então é por isso que se ouve...
- Pois é. As ondas fazem um barulho assim quando se ouvem ao longe. E a gente está longe. Não ouves a voz que lá vem?
- Oiço.
- E depois quebra-se assim como as ondas na areia.
- Então isto é o mar? O mar é o oceano. No mapa chamam-lhe oceano. Parece que há vários... Eu já ouvi aos que andam no quarto ano: é o Oceano Atlântico, o Oceano Índico...
- Não achas que mar é mais bonito?
- Pois é, mar é muito mais bonito.
De repente, fechou os olhos e juntou as duas mãos sobre o búzio, apertando-o contra o ouvido.
- Agora deve ser um navio que lá vem. É mesmo, é, é um navio...
A mãe aproximou o ouvido, desviando o lenço.
- Não ouves?
Não, a mãe não ouvia. Mas o importante para ele era ter o mar apertado entre as mãos. Lá vinha uma onda... e outra.

Alves Redol, Histórias Afluentes

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Dizem que Finjo ou Minto

Dizem que finjo ou minto

Tudo que escrevo. Não.

Eu simplesmente sinto

Com a imaginação.

Não uso o coração.



Tudo o que sonho ou passo,

O que me falha ou finda,

É como que um terraço

Sobre outra coisa ainda.

Essa coisa é que é linda.



Por isso escrevo em meio

Do que não está ao pé,

Livre do meu enleio,

Sério do que não é,

Sentir, sinta quem lê!



Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Autor do mês


José Luís Peixoto
(Galveias, Ponte de Sor 4 de setembro de 1974, Portugal), é um escritor e dramaturgo português.

É licenciado em Línguas e Literaturas Modernas (Inglês e Alemão) pela UN de Lisboa. Antes de dedicar-se profissionalmente à escrita, trabalhou como professor.

Publicou poesia e prosa. Recebeu o Prémio Jovens Criadores (área de literatura) nos anos 97, 98 e 2000. Recebeu também em 2008 o Prémio de Poesia Daniel Faria, instituído pela Câmara Municipal de Penafiel.

Em 2001, o seu romance «Nenhum Olhar» recebeu o Prémio Literário José Saramago. Está representado em diversas antologias de prosa e de poesia nacionais e estrangeiras.

Em 2001, publica «A Criança em Ruínas», o seu primeiro livro de poesia. Com edições sucessivas, depressa atinge os 15 mil exemplares vendidos - número muito invulgar para um primeiro livro de poesia.

É colaborador de diversas publicações nacionais e estrangeiras (Time Out, Jornal de Letras, Visão).

Em 2005, escreveu as peças de teatro «Anathema» (estreada no Theatre de la Bastille, Paris) e «À Manhã» (estreado no Teatro São Luiz, Lisboa).

Em 2006, publicou o romance «Cemitério de Pianos». Em 2007, em Zaragoza, este romance recebeu o Prémio Cálamo - Otra Mirada, atribuído ao melhor romance estrangeiro publicado em Espanha nesse ano.

Em 2007 estreou a peça "Quando o Inverno Chegar", no Teatro São Luiz, em Lisboa.

«Nenhum Olhar» (publicado no Reino Unido sob o título «Blank Gaze») fez parte da lista do Financial Times dos melhores livros publicados em Inglaterra em 2007.

Os seus romances estão publicados em vários países, estando traduzidos num total de 18 idiomas. Os seus romances foram publicados por algumas das editoras mais prestigiadas do mundo.

Em 2008, após a edição de «Nenhum Olhar» nos Estados Unidos (sob o título «The Implacable Order of Things», este romance foi integrado na selecção semestral "Discover Great New Writers" das livrarias Barnes & Noble, sendo o único romance em língua estrangeira a fazer parte dessa lista.

Interessante o comentário dos críticos franceses em relação ao romance Cemitério de pianos: 'O romance de José Luís Peixoto é uma proeza literária servida de uma escrita com nervos à flor da pele, de lágrimas e de sensibilidade.' Folio/Gallimard editora.

Em 2009, Os livros «Morreste-me» e «Gaveta de Papéis» são publicados em braile.
Em 2010 publica «Livro», um romance que se centra sobre a emigração portuguesa em França nos anos 60.

Os seus livros têm tido referências críticas em publicações internacionais de referência.

Este mês sugerimos o livro...

Fernão Capelo Gaivota é um romance de Richard Bach, publicado em 1970 nos Estados Unidos com o título de "Jonathan Livingston Seagull — a story”.

Havia, no Bando, uma gaivota especial, muito diferente das outras. Buscava a perfeição, queria voar sempre mais alto e mais rápido... Mas, para o Bando, isso era uma irresponsabilidade intolerável. A história maravilhosa da única gaivota que sabia que todas as aves são livres, mesmo que não tenham consciência disso...

Na superfície do azul brilhante do céu, tentando a custo manter as asas numa dolorosa curva, Fernão Capelo Gaivota levanta o bico a trinta metros de altura. E voa. Voar é muito importante, tão ou mais importante que viver, que comer, pelo menos para Fernão, uma gaivota que pensa e sente o sabor do infinito. E verdade, que é caro pensar diferentemente do resto do bando, passar dias inteiros só voando, só aprendendo a voar, longe do comum dos mortais, estes que se contentam com o que são, na pobreza das limitações. Para Fernão é diferente, evoluir é necessário, a vida é o desconhecido e o desconhecível. Afinal uma gaivota que se preza tem de viver o brilho das estrelas, analisar de perto o paraíso, respirar ares mais leves e mais afáveis. Viver é conquistar, não limitar o ilimitável. Sempre haverá o que aprender. Sempre.

O livro é uma alegoria sobre a importância de se buscar propósitos mais nobres para a vida. O autor usa uma gaivota como personagem principal. Um pássaro que, diferente dos outros de sua espécie, não se preocupa apenas em conseguir comida. Este está preocupado com a beleza de seu próprio vôo, em aperfeiçoar sua técnica e executar o mais belo dos vôos. Uma metáfora sobre acreditar nos próprios sonhos e buscar o que se quer, mesmo quando tudo parece conspirar contra isso.

Este mês sugerimos o filme...

Freedom Writers

(Páginas de Liberdade)


É um filme norte-americano lançado em 2007. Dirigido por Richard LaGravenese e produzido por Danny DeVito, Michael Shamberg e Stacey Sher, o filme conta com Hilary Swank como protagonista e é inspirado no livro The Freedom Writers Diaries, que relata a vida da professora Erin Gruwell e dos seus alunos.

Através das páginas dos diários dos alunos que vivem em meio ao caos urbano por causa da discriminação racial e pré-conceitos, uma professora idealista, Erin Gruwell (Hilary Swank) tenta mudar o ambiente na sala-de-aula, ensinando não só os conteúdos da sua disciplina, mas também lições de vida, nomeadamente ser cidadão.

Mas para concretizar seus planos, terá que revolucionar o ambiente escolar, e para isso, terá que passar por cima da burocrática e conservadora directora da escola, Margaret Campbell (Imelda Staunton) e abrir mão de sua vida pessoal para com seu marido Scott Casey (Patrick Dempsey).

terça-feira, 10 de maio de 2011

Este mês sugerimos Ouvir...


O projecto musical surgiu em 2006, quando os irmãos Pedro da Silva Martins e Luís José Martins (ex-Bicho de 7 Cabeças) convidaram a prima, Ana Bacalhau, então vocalista dos Lupanar, para cantar quatro canções que tinham escrito. Após perceberem que a voz da prima se adequava na perfeição às rimas e melodias por eles criadas, convidaram também José Pedro Leitão, contrabaixista dos Lupanar (actual marido de Ana Bacalhau), para se juntar aos três, nascendo assim os Deolinda.
O tema "Contado Ninguém Acredita" foi incluído na compilação Novos Talentos de 2007, lançado pelas lojas FNAC.
Em 21 de Abril de 2008 foi lançado o disco de estreia, Canção ao Lado. Desde então, em finais de Outubro de 2008, chegou à sua posição cimeira, o 3º lugar, do Top Oficial da AFP, a tabela semanal dos 30 álbuns mais vendidos em Portugal, tendo saído (e reentrado) por duas vezes nos primeiros tempos, ficado um total de quatro semanas fora desta tabela. Em Outubro de 2008, o disco Canção ao Lado tornou-se "disco de ouro". Em Dezembro de 2008, tornou-se "disco de platina". Durante o ano de 2009, o disco "Canção ao lado" atinge o galardão de dupla-platina, correspondente à venda de mais de 40 mil unidades.
Em 2 de Março de 2009, o disco Canção ao Lado foi lançado no mercado europeu pela editora World Connection. Em Abril de 2009, entrou directamente para o 8º lugar da tabela de vendas discográficas World Music Charts Europe e em Maio subiu ao 4º lugar dessa mesma tabela.
Ainda em Abril de 2009, o grupo deu início à sua primeira digressão europeia. Actuaram em diversos países, entre eles Holanda, Alemanha e Suíça, regressando a Portugal para diversos concertos em cidades como Porto, Braga e Barcelos.
O seu segundo álbum, Dois Selos e Um Carimbo, entrou directamente para nº 1 do top de vendas português e recebeu o galardão de platina em Novembro de 2010.
A canção Parva que Sou, estreada nos quatro concertos feitos nos Coliseus de Lisboa e Porto, em Janeiro de 2011, foi imediatamente considerada um hino de uma geração.
 
 Discografia
             Canção ao Lado (2008) (CD, iPlay / World Connection)
             Dois Selos e Um Carimbo (2010) (EMI Music Portugal)





sexta-feira, 6 de maio de 2011

Os calções verdes do Bruno

Até a camarada professora ficou espantada e interrompeu a aula quando o Bruno entrou na sala. Não era só o que se via na mudança das roupas, mas também o que se podia cheirar com a chegada daquele Bruno tão lavadinho.
No intervalo, em vez de irmos todos brincar a correr, cada um ficou só espantado a passar perto do Bruno, mesmo a fingir que ia lá fazer outra coisa qualquer. A antiga blusa vermelha tinha sido substituída por uma camisa de manga curta esverdeada e flores brancas tipo Havai. Mas o mais espantoso era o Bruno não trazer os calções dele verdes justos com duas barras brancas de lado. A pele cheirava a sabonete azul limpo, as orelhas não tinham cera, as unhas cortadas e limpas, o cabelo lavado e cheio de gel. Até os óculos estavam limpos. Tortos mas limpos.
Lá fora a gritaria continuava. O Bruno, ao contrário dos últimos seis anos de partilha escolar, estava mais sério e mais triste.
Fiquei no fundo da sala. Eu era grande amigo do Bruno e mesmo assim não consegui entender aquela transformação. Olhei o pátio onde as  meninas  brincavam  “trinta e cinco vitórias”. Na porta, uma contra-luz do meio-dia iluminava a cara espantada da Romina. Eu olhava a Romina, o sol na porta e o Bruno também.
O mujimbo já tinha circulado lá fora e eu nem sabia. Havia uma explicação para tanto banho e perfumaria. Parece que o Bruno estava apaixonado pela Ró. A mãe do Bruno tinha contado à mãe do Hélder todos os acontecimentos incríveis da tarde anterior: a procura de um bom perfume, o gel no cabelo, os sapatos limpos e brilhantes, a camisa de botões. A mãe do Bruno disse à mãe do Hélder, “foi ele mesmo que me chamou para eu lhe esfregar as costas”.
Depois do intervalo o Bruno passou-me secretamente a carta. Começava assim:

            Romina: nos últimos dias já não consigo lanchar pão com marmelada e manteiga, e mesmo que a minha mãe faça batatas fritas nunca tenho apetite de comer. Ainda por cima de noite só sonho com os caracóis dos teus cabelos tipo cacho de uva…

A carta continuava bonita como eu nunca soube que o Bruno sabia escrever assim. Ele tinha a cara afundada nos braços, parecia adormecido, eu lia a carta sem acreditar que o Bruno tinha escrito aquilo mas os erros de português eram muito dele mesmo. Era uma das cartas de amor mais bonitas que ia ler na minha vida, e eu próprio, anos mais tarde, ia escrever uma carta de amor também muito bonita, mas nunca tão sincera como aquela.
A camarada professora era muito má. Veio a correr e riu-se porque eu tinha lágrimas nos olhos. Pegou na carta e rasgou tudo em pedacinhos tão pequenos como as minhas lágrimas e as do Bruno. A Romina desconfiou de alguma coisa, porque também tinha os olhos molhados.
O sino tocou. Saímos. Era o último tempo.
No dia seguinte, com um riso que era também de tristeza e uma espécie de saudade, o Bruno apareceu com a blusa dele vermelha e os calções verdes justos com duas riscas brancas de lado. Deu a gargalhada dele que incomodava a escola toda e veio brincar connosco.
Na porta da sala, uma contra-luz amarela do meio-dia iluminava a cara bonita da Romina e os olhos dela molhados com lágrimas de ternura. E o Bruno também.
Ondjaki, in Os da Minha Rua

terça-feira, 3 de maio de 2011

Concurso Nacional de Leitura - fase distrital

No dia 28 de Abril teve lugar no auditório municipal de Alcácer do Sal a Fase Distrital do Concurso Nacional de Leitura, um evento muito bem organizado pela respectiva Biblioteca Municipal. Neste evento participaram cerca de 80 alunos, dos quais cerca de 55 do 3º ciclo e os restantes do ensino secundário. A biblioteca escolar teve muito gosto em acompanhar as alunas que foram representar a nossa escola, Maria Inês Duarte, Mafalda Sarmento e Rita Rodrigues, que, embora não tenham passado à fase seguinte, se enriqueceram com esta experiência.

Para o ano há mais!